Todos nós somos fascinados pela influência de determinadas datas em nosso cotidiano. Existem algumas épocas que nos excitam pela festividade que as acompanham, como o carnaval e os festejos juninos no Brasil; outras datas que nos empolgam pelo seu simbolismo, como a semana santa e as festas natalinas e há até aquelas que nos remetem ao nosso dever cívico, como os feriados de 7 de setembro, com o seu desfile em praça pública e a celebração da proclamação da república brasileira, pelos militares golpistas no 15 de novembro.
Particularmente sempre prestei bastante atenção a estes momentos, alguns deles marcados pelo rito e pelo afloramento de sentimentos variados por parte das pessoas. Lembro ainda quando criança o quanto eram importantes três dias: Dia das bruxas, dia de todos os santos e dia de finados. Normalmente íamos para a igreja, acendíamos velas em casa para nossos parentes mortos, não ouvíamos músicas ou comemorávamos qualquer coisa. O respeito pela morte dos outros era o motivo central para nos silenciarmos naqueles dias, ou pelo menos no dia de finados. Afinal, no portão de um cemitério paulista está escrito: "Nós que aqui estamos, por vós esperamos". Não é esta uma verdade?
Mas neste ano pude observar o quanto o pesar pela morte ou desencarnação de nossos parentes e amigos, tem sido pouco sentido por muitas pessoas. Além da movimentação e do comércio nos cemitérios locais, o clima não estava nada fúnebre: era apenas um grande feriado. Isso nos mostra o quanto estas práticas culturais e religiosas perdem o seu sentido diante de um mundo cada vez mais interligado.
Do começo desta semana, ou seja, do domingo (31.10), passando pela segunda (1º.11) até a terça-feira (2.11), vivemos a sucessão de três dias auspiciosos: Dia das bruxas; Dia de todos os santos; Dia de Finados.
E qual o significado destas três datas? Por quais motivos elas aparecem juntas no calendário ocidental?
A origem remonta à Europa antiga. Segundo alguns especialistas, o povo celta que habitava a Grã-Bretanha, acreditava na existência de forças malignas e espíritos do mal. Os celtas acreditavam que os espíritos dos mortos abandonavam suas covas no cemitério na última noite do verão, ou o Samhain (31.10) para buscar os vivos. Existiam muitas deidades entre eles, as fadas eram consideradas bem reais, não apenas como parte de uma tradição oral, mas como seres que partilhavam o mesmo espaço que os celtas. Para eles, existia outro mundo, o "Otherworld" era habitado pelas divindades e os espíritos dos mortos descansavam nesta terra de sol constante e calor intenso.
Com a cristianização, os seres da mitologia celta foram transformados em demônios e as fadas em bruxas. O dia 31 de outubro, ficou conhecido como Dia das Bruxas e as pessoas passaram a colocar determinados tipos de objetos para afastar a presença destas entidades de suas casas.
Assim, a Igreja Católica tratou de criar um dia para a celebração de todos os santos cristãos, provavelmente no século IV, numa tentativa de arrastar as pessoas para seu modelo de crença, a partir do exemplo dos primeiros mártires e religiosos católicos. Séculos depois, ela estabeleceu um único dia para a celebração aos mortos. Desta vez, os vivos fariam o caminho inverso: visitariam os cemitérios com flores, velas e preces, como oferendas para os espíritos dos parentes mortos. Os mortos não retornavam mais para fazer mal aos vivos. Eram os vivos que ultrapassavam o limiar e se encontravam no espaço da morte, para rememorar aqueles que tinham vivido entre eles.
Lendo o Dicionário de Simbologia de Manfred Lurker, fica claro para mim que os dias que vão de 31 de outubro até 02 de novembro tratam da morte e da sua representação em diferentes contextos históricos e sociais e o que é mais importante, ela é tomada como a ponte entre o mundo do além (otherworld) e o mundo dos vivos, ou nas palavras de Lurker: "apenas uma passagem para outro estado".
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