domingo, 30 de setembro de 2007

Nossas Puttanas

É de domínio público a expressão: "Todos os caminhos levam a Roma". Numa época de imperialismo, era preciso construir estradas e vias que facilitassem o escoamento das riquezas que vinham de todas as províncias conquistadas pela antiga "Caput Mundi". Também eram por estas vias que os conquistadores romanos levavam o seu domínio e toda a danação que o acompanhava. Muitos dos aspectos da história romana foram documentados e registrados. Nickie Roberts escreveu " As prostitutas na história" e destacou a realidade em Roma nos tempos imperiais.
Hoje todos os caminhos levam para outra capital, não mais uma que controle o mundo, mas outra que é por ele prostituída: Natal.
Diferentemente de Roma antiga, Natal já nasceu cidade, mas não criou uma identidade própria, sendo alvo de todos os modismos e apagamentos da memória local.
As duas realidades estão separadas pelo tempo histórico, mas existe um paralelo entre ambas as urbs: tanto em Roma antiga, quanto na Natal moderna, a prostituição é uma instituição permitida e que sobrevive graças a conivência de políticos e altas autoridades. E da cultura e de todos.
Em Roma, as prostitutas pagavam impostos e eram responsáveis por parte da receita do império. Em Natal elas movimentam hotéis, pousadas, agências de viagem e restaurantes.
No antigo império romano havia uma diferença entre as prostibulae e as puttanas, pois enquanto as primeiras tinham os seus serviços tributados pelo governo, as últimas ofereciam os seus favores sexuais a qualquer um e por qualquer preço.
Em Natal todas são puttanas, mas o que choca ao cidadão que passa, por exemplo na Avenida Engenheiro Roberto Freire ou na orla de Ponta Negra é a queda no limite de idade entre as prostituras daquela área. O que favorece a exploração infantil embaixo das pálpebras cerradas do governo local.
A cidade presépio mostra ao mundo que não produz Marias e que não importa com a história que vai ser contada no futuro sobre essa época na qual suas mulheres são desvalorizadas e vendidas por poucas moedas, nem sempre de ouro, no mercado da vida e quando ameaçadas de apedrejamento, nunca há um Cristo para sua defesa.
O que falta para Natal mudar este quadro? Ainda não se sabe, mas acredita-se que as famílias natalenses ainda se espantam com algumas cenas que já viraram cotidianas e que esperam ações políticas para alterar esta situação e impedir a escrita de um livro cujo título poderá ser: A prostituição em Natal no século XXI.
Artigo publicado no Jornal de Hoje em: 28 de dezembro de 2004.

O livro das memórias perdidas

O filófoso francês Jean Pol-Droit nos convida no seu livro "Cento e uma experiências de filosofia cotidiana" para uma dinâmica simples e ao mesmo tempo, complexa: encontrar lembranças perdidas. Eu me deparei com esse desafio quando recebi em mãos o livro do jornalista paulista Guilherme Bryan: "Quem tem um sonho não dança". A obra foi editada pela editora Record e chegou nas livrarias natalenses quase que simultaneamente com o lançamento na região sudeste do país.
Antes mesmo de começar a leitura, procurei buscar em minha memória como tinha sidopor mim registrada a época chamada pelos mais críticos de "perdida", do ponto de vista da produção cultural. Depois de algum esforço, imagens, sensações e sons começaram a povoar a minha mente e os anos oitenta estavam novamente dentro de meus pensamentos. É claro que a vivência de uma criança não poderia ter sido muito rica em detalhes, mas eu acompanhei toda aquela efervescência através de uma tia adolescente. O tom era de rebeldia sem causa, pois não havia mais nada pra frustrar e limitar a criatividade jovem. Não posso esquecer a postura dela, usando camiseta preta com blusa de tela laranja, colecionando figurinhas para o álbum do RPM e sempre animada com as apresentações do Menudo no nosso televisor, preto e branco. O que me deixava encantada com aquela juventude era seu total descompromisso com o mundo.
Por muito tempo eu não percebi que os anos oitenta poderiam ter sido algo muito maior do que uma década embalada ao som da Blitz e com a Armação Ilimitada passando na telinha de nossa casa. Guilherme Bryan quebrou com a minha falsa ilusão e me ajudou a compreender o verdadeiro valor da geração passada a partir do seu rico e surpreendente livro.
Quem tem um sonho não dança: Cultura jovem brasileira nos anos 80, foi o companheiro das minhas férias e só agora termino a leitura. Através de dezesseis capítulos pude perceber a construção da história e o sentido dado por aqueles jovens ao seu próprio tempo. Anos de redemocratização, de maior liberdade nas urnas e de maior expressividade favoreceu um novo viver e um outro olhar para o cotidiano e a arte.
O livro traz depoimentos, relatos, fotografias e muito da memória brasileira. Foi um trabalho gigantesco feito pelo escritor, mas que nos deu um panorama vívido dos anos 80.
Para o crítico que ainda não teve a oportunidade de ler o resgate de nossa cultura realizado por Guilherme Bryan, resta uma frase do Evandro Mesquita: "Você não soube me amar". E ainda um convite, para os que acreditam na importância do registro: leiam e embarquem nessa enriquecedora viagem encontrando um pouco de cada um nas memórias perdidas dos anos 80.
Artigo publicado no Jornal de Hoje em: 22 de abril de 2005.

Rússia, prisão dos povos

Parecia ser uma tarde tranquila, mas o clima foi quebrado quando abri o jornal e tomei conhecimento do desastre na escola russa. Fiquei por alguns segundos parada (...). Na minha memória veio a imagem de quando meu jardim de infância foi cercado pela polícia para prender um bandido e, após a troca de tiros, nós alunos da alfabetização, saímos correndo da escola olhando para nossos pais, que estavam aflitos do outro lado da rua e tendo como companhia a nossa "tia" do jardim, histérica.
A escolinha já não existe mais; mas as lembranças me marcaram profundamente e ao assistir pelo noticiário o ataque à escola da Ossétia do Norte, revivi um pouco aquela situação.mesmo estando muito distante dó problema russo.
Hoje, como historiadora, preciso me distanciar dessa tragédia para fazer uma provocação: quem é o responsável pelo massacre em Beslam? Apontar os terroristas como os únicos responsáveis pelo atentado, parece óbvio até porque a mídia internacional está interessadas nas eleições americanas. Mas, se voltarmos na história descobriremos que a Rússia jamais sustentou a tradição de respeitar as diferenças e as peculiaridades dos povos que a compõe.
Foi assim durante o czarismo do paizinho Nicolau II antes de 1917 e, mesmo quando explodiu a revolução socialista, muitas etnias continuaram alienadas dos seus direitos e reprimidas pela ditadura stalinista.
No final do século XX, o mundo viu o ressurgimento dos ideais separatistas na antiga prisão dos povos, entretanto, ainda testemunhamos o quanto a ex-URSS tenta manter os seus tentáculos sobre as etnias que já reconhecem sua própria identidade e lutam pela sua libertação.
O século XXI não pode continuar sendo o tempo e espaço do imperialismo caduco e do terror desmedido. Enquanto não houver uma onda de redemocratização e de reconhecimento e valoração do multiculturalismo, continuaremos vendo os grupos marginalizados recebendo o apadrinhamento de terroristas internacionais e fazendo uso de uma violência estúpida contra não só crianças cheias de sonhos em pátios de escolas, mas de toda uma sociedade civil que paga pela sua omissão com a própria vida.
Artigo publicado no Jornal de Hoje em: 11 de setembro de 2004.

Entrada no Clube de Clio

Entrei no Clube de Clio aos 17 anos de idade. Meus primeiros contatos com a atividade inspirada pela musa grega me deram estímulo para continuar nos últimos anos não só ensinando e debatendo as transformações pelas quais passam os homens e as sociedades ao longo do tempo, mas também a escrita sobre fatos e eventos que me chamaram a atenção nos últimos anos. Este blog é o espaço para editar alguns artigos e também o lócus para o debate e reflexões em torno de nossa humanidade e historicidade.
Sejam todos bem vindos ao Clube, Clio agradece sua visita:
Andréia Mendes

Dia de Reis e os sentidos desse evento para nossa história

 Dia de Reis Magos e os sentidos desse evento para nossa história Está escrito no Evangelho de Mateus, 2:1, (...) eis que magos vieram do Or...