domingo, 30 de setembro de 2007

O livro das memórias perdidas

O filófoso francês Jean Pol-Droit nos convida no seu livro "Cento e uma experiências de filosofia cotidiana" para uma dinâmica simples e ao mesmo tempo, complexa: encontrar lembranças perdidas. Eu me deparei com esse desafio quando recebi em mãos o livro do jornalista paulista Guilherme Bryan: "Quem tem um sonho não dança". A obra foi editada pela editora Record e chegou nas livrarias natalenses quase que simultaneamente com o lançamento na região sudeste do país.
Antes mesmo de começar a leitura, procurei buscar em minha memória como tinha sidopor mim registrada a época chamada pelos mais críticos de "perdida", do ponto de vista da produção cultural. Depois de algum esforço, imagens, sensações e sons começaram a povoar a minha mente e os anos oitenta estavam novamente dentro de meus pensamentos. É claro que a vivência de uma criança não poderia ter sido muito rica em detalhes, mas eu acompanhei toda aquela efervescência através de uma tia adolescente. O tom era de rebeldia sem causa, pois não havia mais nada pra frustrar e limitar a criatividade jovem. Não posso esquecer a postura dela, usando camiseta preta com blusa de tela laranja, colecionando figurinhas para o álbum do RPM e sempre animada com as apresentações do Menudo no nosso televisor, preto e branco. O que me deixava encantada com aquela juventude era seu total descompromisso com o mundo.
Por muito tempo eu não percebi que os anos oitenta poderiam ter sido algo muito maior do que uma década embalada ao som da Blitz e com a Armação Ilimitada passando na telinha de nossa casa. Guilherme Bryan quebrou com a minha falsa ilusão e me ajudou a compreender o verdadeiro valor da geração passada a partir do seu rico e surpreendente livro.
Quem tem um sonho não dança: Cultura jovem brasileira nos anos 80, foi o companheiro das minhas férias e só agora termino a leitura. Através de dezesseis capítulos pude perceber a construção da história e o sentido dado por aqueles jovens ao seu próprio tempo. Anos de redemocratização, de maior liberdade nas urnas e de maior expressividade favoreceu um novo viver e um outro olhar para o cotidiano e a arte.
O livro traz depoimentos, relatos, fotografias e muito da memória brasileira. Foi um trabalho gigantesco feito pelo escritor, mas que nos deu um panorama vívido dos anos 80.
Para o crítico que ainda não teve a oportunidade de ler o resgate de nossa cultura realizado por Guilherme Bryan, resta uma frase do Evandro Mesquita: "Você não soube me amar". E ainda um convite, para os que acreditam na importância do registro: leiam e embarquem nessa enriquecedora viagem encontrando um pouco de cada um nas memórias perdidas dos anos 80.
Artigo publicado no Jornal de Hoje em: 22 de abril de 2005.

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