Como ler um país etnicamente
diverso e eticamente tão frágil? Esta tem sido uma preocupação demonstrada
recentemente por estudiosos e especialistas em todo o Brasil. É claro que
outros já haviam se debruçado em torno desta temática, como os antropólogos
Gilberto Freyre, Darcy Ribeiro e mais recentemente Roberto DaMatta, entretanto
a proposta que se apresenta agora é: ler o Brasil através da lente da ética.
A ética é evocada por todos como
uma entidade acima do bem e do mal, verbalizada nos discursos, debatida nas
salas da academia, entretanto pouco vivenciada seja no foro íntimo, seja no
âmbito mais amplo do social.
Não nos cabe definir ética do
ponto de vista da filosofia ou da sociologia, mas refleti-la no campo das ações
humanas e de suas construções sociais, tanto ao longo da história, quanto na
prática cotidiana, ou seja, a partir do olhar antropológico.
A primeira reflexão sobre ética e
história obtivemos a partir da leitura do livro A assustadora história da
maldade. Na primeira parte da obra,
o autor discute como a moral humana muda ao longo do tempo. Práticas que há 300
anos eram vistas como abomináveis, hoje as vemos sendo aplicadas de forma
naturalizada. Valores tidos como corretos 120 anos atrás na história,
atualmente são percebidos como equívocos ou ingenuidades. Os valores mudam
graças à dinamicidade da história e das construções humanas.
As 48 leis do poder foi outro
livro que despertou a atenção para o tipo de ética que estamos vivendo no
século XXI. Em 48 situações os autores nos chamam atenção para o tipo de
comportamento que devemos estabelecer com as pessoas ao nosso redor, para tirar
o máximo de proveito do esforço e do trabalho delas. É uma obra aética, um
livro despojado de preocupações morais relevantes em relação ao outro, mas
pleno da ética individualista que tanto foi moldada pelo capitalismo nos
últimos dois séculos.
Basta um olhar superficial sobre a
sociedade brasileira para podermos identificar o quanto estabelecemos destas
práticas em nossa história e vivências. Velhas e tão conhecidas fórmulas como
“Você sabe com quem está falando?”, ou a “carteirada” exemplificam um pouco dos
paradigmas que vivemos. O Brasil é a nação do clientelismo, do nepotismo, dos pelegos
e do famoso “jeitinho”, todos são demonstrações que nossa diversidade cultural
espelha uma variedade de comportamentos não acertados que nos impedem o
crescimento de uma cidadania mais plena e viável para o conjunto da população.
Sofremos de uma moral defeituosa e esta necessita de uma mudança, que apenas
pode ser consolidada com uma reflexão em torno de nossas dinâmicas sociais, o
que pode propiciar uma interiorização de novos conceitos que privilegiem o “outro”
antes do “eu”.
Quais tipos de leituras podemos
fazer sobre o Brasil? Utilizando a ética como lente, toma-se a reflexão crítica
como ponto de partida para uma análise da moralidade brasileira, em seguida,
pensar os contextos mostra-se essencial para a tomada de decisões que deve ser
efetuada. A reflexão ética requer problematizar os fundamentos que norteiam
nossas ações. Serve ainda para questionar os valores componentes da moral. Que
tipos de componentes fazem parte da moral que vivenciamos? A sociedade de
consumo, o imediatismo nas relações que estabelecemos com os outros, os jogos
de interesses, as máscaras que assumimos ao longo do dia, nosso pouco
engajamento com as questões sócio-ambientais, tudo serve para a reflexão ética.
Leitura é tarefa difícil, pois
exige a apreensão daquilo que é lido e a formulação de uma reflexão profunda
acerca do que o texto nos tem para ensinar. O desafio é ler o Brasil levando em
consideração a sua trajetória histórica, as suas matrizes formadoras e as
instituições que foram criadas ao longo dos séculos. Ler a partir da ética para
uma mudança de paradigma, que começa dentro de cada um e depois transforma a sociedade.
Assim, devemos ler com compromisso o livro Brasil.
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